Pesquisa revela alto índice de suicídios em bancos

Publicado originalmente em 2010, no saudoso portal Mercado Ético

A notícia de suicídio em massa na France Telecom chocou o mundo. Como revela a matéria “A fábrica de suicídios”, publicada no Mercado Ético na segunda-feira passada (5/10/2009), 24 funcionários da empresa se mataram nos últimos 18 meses. Pressão e assédio moral estavam entre as principais justificativas pelas mortes.

Ladislau Dowbor, economista e professor da PUC, disse que esse é um alerta para todos e que há casos mais visíveis como este da France Telecom.

Ele está certo. Enquanto os focos das atenções estavam voltados à companhia francesa, eis que surge uma pesquisa revelando situação semelhante entre os bancários brasileiros. Realizada por Marcelo Fiazzi, da Universidade de Brasília (UnB), o estudo “Patologia da solidão: o suicídio de bancários no contexto da nova organização de trabalho” mostra um quadro tão assustador quanto o da France Telecom.

Se entre os franceses a média é de uma morte a cada 22 dias, no Brasil, entre 1996 e 2005, período estudado por Fiazzi, a média foi de uma a cada 20 dias. Foram 181 suicídios cometidos por bancários, conforme dados do Ministério da Saúde. O cenário foi ainda pior entre 1993 e 1995, quando foram registrados 72 suicídios, chegando à média de uma morte a cada 15 dias. Além disso, o pesquisador estima que pelo menos um trabalhador do setor bancário tentou se matar em cada dia do período estudado.

O fato impressiona não apenas pelos números, mas também pelo fato do Brasil ter um índice de suicídio relativamente baixo. Em 2004, por exemplo, a média nacional era de 4,5 mortes por essa causa a cada 100 mil habitantes. Na Europa, a média era de 10, enquanto no Japão, impressionantes 25 mortes por 100 mil habitantes.

Procurada pelo Mercado Ético para comentar a pesquisa, a Febraban (Federação Brasileira de Bancos) disse que cerca de 1,8 milhão de funcionários passaram pelos bancos naqueles anos. Apesar de lamentar as mortes, a instituição acredita que se trata de um número pequeno diante do universo de pessoas envolvidas.

Mas mesmo dividindo o número de funcionários da época pelos suicídios cometidos, chega-se a uma média de 10 mortes para cada 100 mil pessoas, o que está bem acima da média nacional.

Causas

Quando se fala em suicídio, é preciso ter muito cuidado ao analisar as causas. Odilon Cunha Jr, psicólogo e gestor de projetos em Saúde, Meio Ambiente e Segurança do Trabalho, aponta que já houve caso em que mortes desse tipo foram relacionadas ao trabalho, mas isso não é unanimidade. Para ele, o suicídio se dá devido a uma convergência de fatores, como por exemplo problemas nas relações de trabalho somadas a um caso de depressão ou transtorno bipolar.

Por outro lado, os resultados da pesquisa de Finazzi evidenciam que as violências e fatores sociais vivenciados pelos bancários, como assédio moral, isolamento social e individualismo foram elementos importantes para se idealizar e tentar o suicídio.

Como aponta o estudo, os bancários estudados por ele que tentaram se matar não tiveram, aparentemente, nenhum incômodo significativo que os levassem a recorrer à ajuda psicológica e médica especializadas. O “ambiente de terror”, como classifica o trabalho, seria a causa para o surgimento de doenças psicossomáticas, como lesões osteomusculares, e dos mais variados transtornos psíquicos.

“Nossa concepção da ‘eficiência’ tal como a ensinamos nas faculdades, as pressões de consultores e marketeiros que querem “resultados” financeiros sem ver os custos humanos, acionistas e especuladores financeiros que apenas vêem a sua conta bancária sem saber que há pessoas por trás dos processos, tudo isso casa com uma visão de empresas que não atentam para os custos ambientais ou sociais, e não entenderam o objetivo básico de toda atividade: o de vivermos melhor, com mais qualidade de vida, e sem destruir o futuro, sem por em risco o planeta”, ressalta Ladislaw Doubor. “É um patológico casamento de racionalidade empresarial com miopia humana. Simplesmente não entenderam do que se trata”, completa.

Clovis Scherer, supervisor do Dieese (Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos) no Distrito Federal, aponta que todos esses problemas já são bem conhecidos pelos sindicatos. Ele vê o caso com estranheza, já que o setor bancário brasileiro é bem colocado e muito lucrativo. “Essas empresas estão explorando seus recursos humanos de forma predatória. Contratam jovens saudáveis e devolvem pessoas incapazes para a sociedade, com problemas de LER (lesão por esforço repetitivo) e distúrbios mentais. Os empregadores tem um sério problema para admitirem isso”, aponta ele.

Soluções

A humanização das relações de trabalho é apontada por Marcelo Fiazzi como fator indispensável para diminuírem as violências no contexto laboral.

Já Clovis Scherer defende um maior diálogo social para se chegar a uma solução. “As vezes o que é adequado para um tipo de trabalho não é para outro. Por isso é preciso que as partes envolvidas conversem. Assim, é possível ter um melhor conhecimento do local do trabalho, do mercado e de uma série de fatores importantes para se resolver a questão”, explica.

Odilon Cunha Jr alinha-se a essa idéia. Para ele, o equilíbrio não está em se evitar os conflitos, mas, sim, em se debater as idéias e buscar novas saídas para determinadas questões. Ele também ressalta que as empresas devem ficar atentas ao ambiente de trabalho, insentivando comportamentos saudáveis e administrando fatores de risco entre seu quadro de colaboradores.

O psicólogo acredita que o ambiente ideal é aquele em que as pessoas podem expressar o que sentem e pensam, sempre respeitando a opinião dos outros.

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